domingo, 10 de fevereiro de 2013

Brasília, o que mais você quer de mim?

Eu não tenho religião. Nada que me faça ter obrigação me agrada. Ter que ir à igreja, ter que fazer oferenda para entidades, ter compromisso com um ser imaginário. Não entra na minha cabeça. Apesar disso, algumas coisas acontecem comigo e eu não sei explicar de forma racional. Entretanto, sempre acredito que tudo teria uma explicação científica ou psicológica e acaba o tempo para tentar entender porque tenho que trabalhar, ou lavar a roupa, ou limpar a casa, ou ir ao mercado, enfim.

Esses dias, me peguei pensando sobre Brasília. Na minha relação com esta cidade há mais de 10 anos. Me fez levantar a hipótese de que, talvez, eu seja a reencarnação de algum político corrupto e esteja encarnada pagamento meus pecados. Só pode.

Brasília na minha vida entra em 2002, quando eu tinha 14 anos. Estava no primeiro ano do ensino médio e coloquei na minha cabeça que queria fazer engenharia na UnB. Sem outra explicação, porque não escolher São Paulo, Florianópolis, ou até minha cidade mesmo? Não, eu queria Brasília. E ia para lá duas vezes ao ano, fazer o processo seletivo.

Em dezembro de 2003 tive a minha primeira grande decepção amorosa em Brasília. Na véspera do meu aniversário de 16 anos, ele disse: "eu só te queria aqui em Brasília, não vou mais te querer quando a gente voltar para nossa cidade. Para de achar que você é minha mãe". Filho da puta. Quem ele achava que era pra não me querer mais? Demorei uns 6 meses pra me recuperar.

Em 2004 passei no vestibular, aqui e em Brasília, mas não pude ir, minha mãe (sempre ela) não deixou. Ela dizia: "NUNCA VOU DEIXAR VOCÊ COM 17 ANOS SOZINHA EM BRASÍLIA, JÁ NÃO TEM NADA NA CABEÇA, VAI SE PERDER". O que ela não via é que eu já havia me perdido, há anos, bem embaixo de seu nariz. Enfim.

Brasília ficou adormecida, até maio 2007, quando minha irmã me disse: "tá sabendo que o pai vai se mudar pra Brasília? Ele foi transferido". Nem acreditei, meu pai não havia me dito nada, com certeza era mentira. Mas não era. Ele não teve coragem de me dizer, pediu pra minha irmã fazer. Em julho de 2007 ele foi embora. Eu fiquei, sozinha, sem muito rumo. Era uma manhã de sábado, ele colocou algumas roupas no porta-malas - não levou nada além disso, beijou minha testa e disse: "dá um jeito nas minhas coisas, venda o que der e se desfaça do resto". Cuidei de tudo e arrumei o apartamento para ser alugado.

Em janeiro de 2008 fui para Brasília ver meu pai e terminei meu noivado. Foi também em Brasília, junho de 2008, que resolvi voltar com meu ex-noivo, que decisão infeliz. Todas as minhas histórias em Brasília envolvem: abandono, erros e infidelidade.

A última vez que pisei meus pés naquela cidade, foi no meu aniversário de 24 anos. Dia 9 de dezembro de 2011, desembarquei no aeroporto com um vestido rodado azul e um sapato baixo bege, senti o vento seco e um tanto fresco. A sensação era de alívio e um leve desconforto estomacal por conta do porre de tequila que eu havia tomado na véspera. Em 8 dias meu pai voltaria de lá para nossa cidade e todo sofrimento estaria acabado. Meu pai voltou, dia 17 de dezembro de 2011. Pensava que minha história com essa cidade já tinha se encerrado.

Agora, em fevereiro de 2013, Brasília voltou. Querendo devorar minha carne e triturar meus ossos outra vez. Furar meus olhos e esmagar meus joelhos. Moer meu coração e dilacerar minha pele. Me jogar de um lado para o outro, me violentar, me tirar a paz, me fazer chorar. A cidade que foi construída sobre o suor dos nordestinos, para ser sede da corrupção, jogou o verde triste do cerrado em meus olhos, para sempre.

"No princípio era o ermo: Eram antigas solidões sem mágoa.
O altiplano, o infinito descampado.
No princípio era o agreste: O céu azul, a terra vermelho-pungente
E o verde triste do cerrado.
Eram antigas solidões banhadas de mansos rios inocentes 
Por entre as matas recortadas". 
Vinícius de Moraes - Brasília, Sinfonia da Alvorada

Heleninha

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